segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 15



TARQUÍNIA – ITÁLIA

No dia da chegada em Tarquínia, manhã de 7 de outubro de 1944, ninguém ficou sem fazer nada, houve trabalho para todos, sem exceção. No dia seguinte, embora domigo, o trabalho continuou em ritmo acelerado e exaustivo. Armar barracas e ajeitar o acampamento era a ordem do dia.

Várias ferramentas foram usadas, enxadas, pás, picaretas, serrotes e até machados.

Enquanto uns esticavam as lonas das barracas, outros abriam pequenas valas ao redor das mesmas, com a finalidade de facilitar o escoamento das águas das chuvas, pois, o terreno era baixo e alagadiço. Os mais especializados se encarregavam da parte elétrica, puxando fios por todos os lugares e levantando postes, a energia era fornecida por um grupo de geradores portáteis.

Dia 9 de outubro ainda continuava a faina, agora, desmanchando caixotes e arrumando o material. Nesse dia ficamos sem almoço para dar maior progresso aos serviços, fazendo os últimos retoques no acampamento.

Finalmente, tudo ficou pronto para funcionar, parecendo até uma pequena base. Ao centro o rancho, a cantina, posto médico e órgãos administrativos, circundados pelos alojamentos do pessoal, na periferia dos quais se instalaram banheiros e privadas. A bóia era servida ao ar livre, em longas filas na quais a utilização de marmitas de campanha irmanava oficiais e praças, e assim continuou sendo por muito tempo, até que se ultimasse a instalação das compridas barracas-refeitórios e fosse equipada com louça modesta o racho de oficiais.

Tínhamos como vizinhos o 345º Esquadrão Americano. Um temporal caiu na segunda noite da estada em Tarquínia, fazendo desabar metade do acampamento, provocando um grande corre-corre.

Na seção de mecânica, embora mal instalada, logo na primeira semana iniciou-se o recebimento e preparo dos trinta aviões P-47, com os quais os pilotos começaram a operar.


O major Pamplona, chefe das operação, já havia feito a denominação técnica das esquadrilhas e numeração correspondentes aos aviões. Assim as esquadrilhas, ficaram sendo A,B,C,D. e os aviões numerados, A-1, A-2... B-1, B-2 ...e assim por diante. Cada piloto tinha o seu próprio. Os Mecânicos foram distribuídos por esquadrilhas e por aviões. Não sei qual foi o critério adotado, mas fiquei muito contente ao ser designado para mecânico do avião do comandante do Grupo, tenente coronel Aviador Nero Moura, avião número 1.

Para meus ajudantes foram escalados os cabos Aderson de Oliveira Lima e Pedro Rodrigues. Aderson, praça antiga, oriundo da Marinha, baixinho, franzino, muito engraçado e espirituoso, tinha a habilidade de imitar as pessoas, fazendo - nos rir. Durante a campanha, repartimos alegrias e tristezas. Haverei sempre de recordar os meus auxiliares.

Estávamos tecnicamente subordinados aos oficiais especialistas, da seção de mecânica, Tenente Jayme Flores, armamentos e comunicações, os tenentes Jorge Prado e Lucidio Chavez.

Na primeira semana houve muito trabalho na pista para o pessoal da mecânica, cada avião seria vistoriado meticulosamente, parte por parte, antes de se proceder o cheque do motor, o qual deveria dar 2.700 RPM e 52 polegadas de mercúrio de compressão, para ser considerado OK.Isto é pronto para partida.

O pessoal de comunicações procedia ao cheque do rádio, fazendo chamadas com torre de controle para teste, regulando o VHF e fazendo as trocas dos cristais, etc.. Rotina semelhante era seguida pelos de armamento, retirando as estocagens das metralhadoras e instalando-as no avião, municiando-as e preparando os cabides para receberam as bombas.


Dois fatos de grande importância marcaram o dia 14 de outubro de 1944, o hasteamento da bandeira e os primeiros vôos de treinamento. Na história dos povos coube-nos assim a honra de sermos a primeira Força Aérea Sul Americana que cruzou oceanos e veio alçar suas asas sobre os campos de batalha europeus.

Antes de entrar em ação no velho mundo, o 1º Grupo de Caça cumpriu o sagrado dever de plantar em território inimigo a Bandeira do Brasil.

"Camaradas! Para frente, para a ação, com o pensamento fixo na imagem da Pátria, cuja honra e integridade juramos manter incólumes. Cumpre-nos tudo enfrentar com fortaleza de ânimo, a fim de manter intacto esse tesouro jamais violado, a honra do soldado brasileiro! E nós o faremos, custe o que custar!"

O boletim, que soube tão bem traduzir nossos sentimentos, foi lido perante a tropa formada naquela manhã alegre, quando os ventos do Mediterrâneo desfraldaram pela primeira vez o Pavilhão auriverde de um país longínquo, cujo povo, amante da paz, sabe também lutar pela liberdade e reagir à agressão.

E, por mais de um ano a fio, aquela bandeira, que foi à guerra conosco, simbolizou galhardamente, ao apenas a Pátria, mas também o carinho feminino das mães, esposas e noivas deixadas para trás, cujo espírito, drapejando alegre nos ventos do heroísmo, baixando a chorar sobre o ataúde dos mortos.

Na mesma tarde, pilotos brasileiros alçaram as asas em treinamento de navegação pela Toscana e adjacências, travando conhecimento com a nova base de operação.

O Tenente Lima Mendes, com grande entusiasmo, contando com a cooperação do nosso sargentiante José Adolfo Teixeira e auxiliares pelo sargento Cláudio de Andrade Dias e sua equipe de pintura, encarregou-se de estampar na carenagens da seção dos acessórios do motor dos P-47 a insígnia " Senta à Pua ", famoso avestruz desenhado pelo capitão Fortunato Câmara de Oliveira.






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