sábado, 20 de fevereiro de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 17


OPERAÇÕES

Acampados na base avançada de Tarquínia, estava o Grupo pronto para entrar em combate.
Nosso efetivo era de 452 homens e seis mulheres, nossas enfermeiras. De uma relação de todos que pertenceram ao Grupo de caça constam: 54 Oficiais Aviadores, 5 Oficiais Intendentes, 9 Oficiais Médicos, 1 Oficial Capelão, 3 oficiais Especialistas em Aviões, 2 Oficiais Especialistas em Armamento, 1 oficial Especialista em Comunicações, 9 Suboficiais, 168 Sargentos das diferentes especialidades, 81 cabos, 103 soldados de 1ª
e 2ª classes, 3 soldados e 13 Taifeiros. O Grupo de Caça teve um efetivo flutuante.
Dos Oficiais Aviadores, alguns desempenhavam funções especificamente administrativas.
Vale salientar que quando o 1º Grupo de Caça entrou na luta contava com 39 pilotos operacionais, em seis meses de operações, teve 16 pilotos abatidos pelo inimigo, sendo 5 mortos, 5 aprisionados, 3 foragidos com auxílio de partigiane, 3 que conseguiram agüentar-se em vôo para caírem já em território aliado.
É verdade que recebemos 6 novos elementos durante a campanha, mas perdemos prematuramente outro tanto por doença ou morte em desastre. A média chegou assim a quase 3 pilotos abatidos por mês, atingindo no conjunto 41 por cento do efetivo.

Os brasileiros foram incorporados à 12ª Força Aérea Americana, principalmente componente da Força Aérea Tática Aliada de invasão no Mediterrâneo.
A maior nota e fora do comum da 12ª Força Aérea consistia na sua variedade de material aéreo.
Desde o início da campanha no Norte da África, foi a maior força aérea independente do mundo e assim ficou, até que seus bombardeiros pesados foram separados e agrupados naquilo que passou a ser a 15ª Força Aérea Americana.
Unidades da 12ª Força Aérea operando na Inglaterra, Norte da África, Pantelleria, Lampedusa, Sicília, Córsega, Sardenha, Yugoslávia, Itália, França, Índia e Burma.
Era o principal componente da Força Aérea Tática aliada do Mediterrâneo e composta de americanos, Ingleses, Brasileiros, Canadenses, Sul-Africanos, Poloneses e Franceses, sendo comandada por alguns dos mais famosos táticos de guerra aérea da História Militar, General Carl A. Spaatz, Tenente- General James H. Doolittle, Tenente-General John K. Cannon e Major-general Benjamim W. Chidlaw.
Os chefes da aviação americana que tiveram sob suas ordens o Grupo de Caça Brasileiro foram respectivamente os seguintes, por escalões ascendentes: Tenentes-Coronéis Ariel W. Nielsen e John C. Robertson que, em ocasiões diferentes, comandaram o 350º Regimento de Caça, o Brigadeiro-General Robert S. Israel, que comandou a 62ª Brigada de caça, o Major-General Benjamim W. Chidlaw, que comandou o XXII Comando Aéreo Tático, e o Tenente-General John K. Cannom, que comandou a Força Aérea Tática do Mediterrâneo, e o General Ira Eaker, que comandou toda a Força Aérea Aliada no Mediterrâneo.
Para efeito de emprego, o 1º Grupo de Caça incorporou-se ao 350º Regimento de Caça dos Estados Unidos da America do Norte e dentro da Organização da Força Aérea do Mediterrâneo, passou a figurar no seguinte quadro.
As diferentes missões atribuídas aos elementos componentes da Força Aérea Aliada no Mediterrâneo, compunham das seguintes partes principais.


a) A Força Aérea Estratégica (15ª Força Aérea), com grande independência de ação, e com as operações coordenadas com outra Força Estratégica estacionada na Inglaterra.

b) A Força Aérea Tática cuja missão era o apoio aos Exércitos em operações na Itália e cujo raio de ação não se estendia além das fronteiras norte daquele país, compunha-se de três partes principais.



- O XXII Comando Aéreo Tático, cuja missão era fornecer apoio aéreo ao 5º Exército Norte Americano.

- A Força de Bombardeio Tático, que atuava em proveito do Grupo de Exércitos.
c) A Força Aérea Costeira, que se encarregava da campanha anti-submarina, dos

ataques à navegação marítima do inimigo e da Defesa Aérea.
Quando o 1º Grupo de Caça chegou a Itália, o 5º e o 8º Exército aliados integrantes do 15º Corpo de Exército, encontravam-se em plena batalha nos Apeninos, em luta contra as forças alemães instaladas na afamada linha gótica coma qual pretendiam barrar o seu acesso ao Vale do Pó. As Forças Aéreas desfrutavam de invejável condição, podendo prestar-lhe valioso apoio naquela difícil conjuntura.
A superioridade aérea de há muito já havia obtido, encontrando-se os céus da Itália praticamente livres da aiação inimiga, embora não estivesse de uma artilhria eficiente e controlada pelo radar, tornando-se uma arma tão perigosa para os pilotos, como qualquer força aérea.
Em 31 de outubro de 1944, o chefe de operação e os quatros comandantes de esquadrilhas, capitães Lafayette, Fortunato, Joel e Lagares, decolaram com alas de esquadrilhas americanas, em missões de bombardeio picado contra o inimigo. Nos dias subseqüentes, outros pilotos efetuaram surtidas em condições semelhantes, integrando esquadrilhas ianques.
Dir-se-ia que entrávamos com o pé esquerdo na campanha. Sim, logo de saída perdemos o Tenente Cordeiro, abatido em 6 de novembro de 1944 pela antiaérea inimiga quando integrava uma esquadrilha americana. No dia seguinte veio a falecer em acidente o Tenente Sapucaia, quando realizava um vôo de treinamento nas proximidades da base.
Finalmente o Grupo passou a voar sozinho, isto aconteceu no dia 12 de novembro de 1944. O Major Pamplona disse que iam todos, as quatro esquadrilhas, fazer um reconhecimento aéreo armado, sob o Comando do Tenente Coronel Nero Moura, nosso Comandante.
Não levaram bombas, iam fazer reconhecimento da região e ver se não havia caças inimigos. Mas levavam balas, mais de dois mil e quinhentos tiros por avião, e as metralhadoras estavam estalando de boas. Os avestruzes também.
A emoção dominava oito aviões em linha de combate. O Coronel Nero Moura, comandava. Estavam próximos aos Montes Apeninos. Passamos a terra de ninguém, um ao lado do outro, com distância de trezentos metros, em linha transversal duas esquadrilhas na frente, duas atrás. Oito a oito, os avestruzes voavam. Súbito, uma voz gritou pelo rádio: Flak – artilharia antiaérea em ação. E começamos a pular. Os alemães não brincavam em serviço. O famoso canhão 88m, o mais versátil do mundo, cantava sua canção de fumaça negra. Era a guerra. Granadas explodiam ao nosso lado, fumaçando num diâmetro de cinco metros, e nós pulávamos. Eram o horror e a morte. Os avestruzes pulavam. O 88mm comia solto, fumaçando. Canhão antitanque, antitropa, antiaéreo, poderoso era nosso paraninfo.
Recebíamos nosso batismo de fogo, pelo sal das granadas. Era a guerra. Até doze mil metros de altura ele nos alcançaria. Atirava sob controle do radar, enviando-nos granadas de quatro, oito e doze explosões. Mas nós pulávamos, éramos de circo, avestruzes. A espionagem havia funcionado. Os Alemães sabiam que era o Grupo de caça Brasileiro que estava estreando e tentava nos intimidar. Inútil. Estávamos dispostos a Sentar a Pua. E pulávamos, dançávamos no ar, fugindo das balas, dando um show de picardia.
Assim, o 1º Grupo de caça combate com força independente, arcando, portanto, com todas as responsabilidades da manobra, que exigem uma administração própria, assistência e eficiente serviço de reparação de material avariado. E tudo isto é dada à nossa unidade de guerra pelo valor e o preparo técnico de seus homens, que chegaram mesmo a surpreender nossos aliados americanos.
Para que se efetivasse essa eficiência, havia um perfeito sentimento de compreensão e cooperação entre todos os homens do Grupo.
Todos procuram esquecer os sofrimentos e as agruras particulares, firmando e dirigindo suas energias para a luta, cônscios de seu papel de brasileiros e de seu dever de soldado que haveria de colocar o nome de nossa Pátria nas páginas da História daquela guerra de libertação.
Naquele dia, o trabalho na pista foi dobrado para todos os sargentos especialistas em aviões, armamento e comunicações. Todos os aviões foram cuidadosamente examinados, quanto a um possível dano causado pela antiaérea inimiga algumas panes foram sanadas, feito o reabastecimento de óleo e gasolina para a missão de madrugada do dia seguinte.
Agora já começava a escurecer, rumávamos para o acampamento e após um pequeno asseio, que consistia em remover do rosto e das mãos um pouco do óleo, jantávamos e íamos para as barracas, doze sargentos em cada. A minha abrigava os seguintes companheiros: Assunção, Konrath, João Rodrigues, Augusto Gonçalves, Cantisani, Primi, Senra, Cançado, Pelágio, Medeiros, Marinho e Paiva, o autor deste trabalho.
Minha cama de campanha ficava do lado da de João Rodrigues e tinha a inconveniência de ficar perto da porta e todas as vezes qua alguém entrava ou saia nós recebíamos uma lufada de vento gelado. Lá fora a neve que começava a cair se misturava com a lama. Uns tratavam de colocar sua correspondência em dia. Como era bom e confortador receber cartas de casa.
João Rodrigues ( Joãozinho), enrolado num cobertor, sentado na sua cama, com uma pequena maleta de madeira sobre as pernas servindo de mesa, escrevia quase diariamente para sua noiva Maria. Muitas vezes eu lhe perguntei, como arranjava assunto, uma vez que não podíamos contar nada sobre nossa vida de campanha.
As noites no acampamento em Tarquínia eram tristes, o sono demorava a chegar, apesar do trabalho exaustivo, durante o dia na pista. Dos possantes alto-falantes instalados pelos arredores dos acampamentos, chegavam aos nossos ouvidos lindas canções, vindas de longe, da América do Norte. Era um programa de transmissão de músicas para os expedicionários. Mas, na verdade, só serviam para aumentar nossas tristezas e nossas saudades.

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