quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 05


O INIMIGO INVÍSIVEL.
Seis meses antes de entrar em guerra, o Brasil já sofria as primeiras perdas. A partir de fevereiro de 1942, os submersíveis do eixo, em desenvolta ação no Atlântico, passaram a atacar os navios mercantes brasileiros, afundando-os impiedosamente. Nossa Marinha de Guerra já estava engajada na luta contra o inimigo invisível.
Em 1943, foi adotado o Comando Único Aliado para as operações estratégicas na área do Oeste do Atlântico Centro-Meridional, ficando a Marinha de Guerra Brasileira representada entre as forças marítimas integradas nesse esquema: Coube a Força Naval do Nordeste, comandada pelo Contra-Almirante Alfredo Carlos Soares Dutra, incorporar-se à 4ª Esquadra dos Estados Unidos da América, comandada pelo Vice-Almirante Jonas Howard Ingram.
Em sua missão de patrulhamento do litoral brasileiro e a tarefa de proteger os navios mercantes do litoral brasileiro e a tarefa de proteger os navios mercantes aliados, a Marinha de Guerra do Brasil teve saliente papel: realizou 251 comboios, sendo 181 em águas brasileiras e 70 em águas estrangeiras, tendo perdido três belonaves, o navio auxiliar Vital de Oliveira, a corveta Camacuã e o cruzador Bahia, que afundou ao termino da guerra, com perda total de 466 homens, entre oficiais e praças. Dos 32 navios mercantes afundados, pereceram 502 tripulantes e 473 passageiros, entre homens, mulheres e crianças.
A utilização, pelas forças Americanas das bases aeronavais do Recife e de Natal representou valiosa cooperação, não só para o desembarque dos aliados na África do Norte, ainda 1942, com o desenvolvimento das operações nessa região e a neutralização do poder ofensivo das forças navais do Eixo no Atlântico Sul, durante o resto do conflito. "Na defesa da costa brasileira, a Marinha de Guerra do Brasil, que nas águas do Nordeste, área mais infestada pelos submarinos inimigos, empenhava dois cruzadores, o Rio Grande do Sul e o Bahia, 11 contra-torpedeiros, 8 corvetas, o couraçado Minas Gerais e no porto do Recife, e o São Paulo, para a defesa fixa dessas cidades".
A participação também da Força Aérea Brasileira, na campanha anti-submarina e a proteção à navegação marítima, decorreu antes da declaração de guerra do Brasil ao Reich em 22 de agosto de 1942. A FAB havia reforçado os seus efetivos nas bases aéreas do Ibura, próximo do Recife, e Parnamirim, em Natal.
O atrevimento do inimigo intensificou nossa vigilância aérea, culminando em 22 de maio de 1942, entre o Arquipélago Fernando de Noronha e as Ilhas Rocas, com ataque a um submarino e afundamento de outro, o U-199, em 31 de julho de 1943, aprisionando 12 sobreviventes, incluindo o comandante. Participávamos ativamente do conflito. Apenas com pouco mais de um ano e meio de criada a jovem entidade militar, arcava com tremendo encargo. Mas, tínhamos motivação e fé. Como esclarece o Exmo. Sr. Tenente-Brigadeiro Nelson Freire Lavenére Wanderley: "Para a mais jovem das Forças Armadas do Brasil, recém criada, o impacto foi terrível. A responsabilidade que lhes foram impostas, no gigantesco e duplo esforço de desenvolvimento e de operações de guerra inadiáveis que surgiram ao longo do litoral, obrigando a Força Aérea Brasileira a uma atividade febril para consolidar a sua organização, para desenvolver sua infra-estrutura, para formar e adestrar seu pessoal, para receber e operar adequadamente mais de quatro centenas de aviões de toda espécie, alguns altamente complexos, recebidos durante os três anos que ainda durou a guerra e, finalmente, para enfrentar numa luta de vida ou morte, poderosos inimigos, já veteranos".
Milhares de missões foram executadas pelos homens da FAB na frente marítima do Atlântico-Sul; missões estas em que participei de umas cinco ou seis, se não me falha a memória, se bem que como simples observador. Mas, foi uma dessas surtidas que desapareceu para sempre no oceano um "North-American", pilotado pelo Aspirante Aviador Bandeira Duarte e o Sargento Mecânico Raul Ferreira de Melo Júnior, este da minha turma; fato bastante lamentado por todos aqui na Base do Recife. Durante muito tempo acreditou-se na possibilidade de que fora abatido por algum submarino nazista e estavam prisioneiros dos alemães.
O Exército concentrou numerosas unidades no Recife, Natal e Campina Grande. Já antes disso instalara no Arquipélago de Fernando de Noronha um destacamento misto, compreendendo unidades de Infantaria, Artilharia e contingente de Engenharia. Os canhões de um Grupo Móvel de Artilharia de Costa e as baterias antiaéreas do ½º RAAAé – Regimento de Artilharia Antiaérea – tinham por missão defender de uma possível incursão inimiga as estratégicas ilhas. Com a ocupação da África do Norte pelos Aliados, desvaneceu-se tal perigo, mas passou Fernando de Noronha a representar mais um trampolim para a África.
Ali pousaram em escala para Dakar, numa pista construída em tempo recorde pelos norte-americanos no decorrer de 1943, os quadrimotores B-24, Liberator, de bombardeio, e vários outros, de transporte. Aviões PBY "Catalina" e bimotor Veja-Ventura davam proteção ao arquipélago. Sobre o papel desempenhado no arquipélago pelos soldados brasileiros, descreveu o Marechal Tristão de Alencar Araripe, que, como General comandava o destacamento: "Lá o vimos sob o Sol escaldante, à chuva e ao vento, de calção e tronco nu, transformando em jangadeiro, pontoneiro e estivador... Relata a extrema dificuldade de abastecimento, diante da intensificação da ofensiva submarina inimiga, e a penúria de alimentação e água: a água para beber vinha das antigas cisternas, velhos algibes do tempo do presídio, e de poços de pequenas profundidades. Era pesada e salobra, e não chegava para matar a sede. A pequena capacidade dos algibes e poços abrigavam o racionamento do liquido indispensável... O corned beef foi por meses a alimentação essencial da ilha, e, por isso, criou-se-lhe ódio... A falta de cigarros, o suplicio dos fumantes... A nostalgia, a neurose da solidão e da saudade contribuíram para desajustamentos profundos em muitos jovens.
No cemitério do Alto da Floresta, em Fernando de Noronha, há sepultado um punhado de bravos anônimos... "A disenteria e o beribéri ceifaram muitas vidas".
Esta ação contra um inimigo invisível é que ficou mais conhecida como a guerra da praia. Esses ex-Combatentes do litoral, da Marinha, Exército e da Aeronáutica, que não tiveram a ventura de atravessar o Atlântico, são merecedores do respeito e admiração do povo brasileiro, vez que contribuíram para a vitória aliada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário