domingo, 14 de março de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 19


PISA – ITÁLIA

Em fins de novembro de 1944, uma ordem das operações oriundas do comando Aéreo Tático esclarecia o seguinte: O Norte da Itália fica dividido em cinco zonas de ações, cada uma das quais será atribuídas a um determinado Regimento de Caça bombardeiros. Em conseqüência, atribui-se ao, 350º Regimento de caça ao qual pertencia ao 1º grupo de caça brasileiro, uma zona delimitada pela linha de segurança ao Sul, e por outra perpendicular a esta, passando pelo Lago de Garda. Dentro deste quadro geral o 1º grupo de caça continuou a saldar os seus compromissos até o dia 2 de dezembro de 1944, com a estabilização da frente de combate, deslocou-se acompanhando o 350º Regimento de caça, para a cidade de Pisa, situada a poucos quilômetros da linha de contato.

O deslocamento para a cidade de Pisa efetuou-se sem nenhum prejuízo das operações. O pessoal de terra deslocou-se antecipadamente com a finalidade de receber os aviões, preparar o estacionamento dos mesmos, e as barracas de suprimentos e manutenção.

Á sudeste de Pisa ficava o aeródromo que servia de base aos brasileiros e americanos. Nada mais que uma antiga pista de concreto, aumentava com o prolongamento de chapas de aço. Um prédio central servia de sede aos departamentos de operações, informações e ao deposito de para quedas. De resto, eram estruturas metálicas de hangares destruídos. Os aviões ficavam guardados na vizinhança, assim como as barracas de lona em que funcionavam as seções de manutenção de aviões, armamentos, comunicações, almoxarifados técnicos.

Os pilotos ficaram hospedados no Alberge Nettuno à margem do rio Arno. O edifício do hotel, esburacado, sujo e bastante danificado pelas bombas, que também destruíram todas as pontes da cidade, mesmo assim, deu abrigo à oficialidade do 1º grupo de caça.

Na margem oposta do Rio Arno, outro prédio servia de quartel aos graduados e soldados dos bombardeios, bastante danificada. Pisa ex-colônia grega e cidade etrusca, foi província romana. É a sede de uma das mais antigas universidades da Itália. É um centro industrial e comercial. Pisa é a cidade onde se encontra a famosa torre inclinada, a qual foi construída entre os anos de 1.174 até 1.350.

Toda de mármore, estilo romântico, o motivo de sua inclinação até hoje é desconhecido.

Os brasileiros chegaram a Pisa começaram a pagar o clássico tributo à famosa Torre. Sim, ela continua de pé e classicamente inclinada, embora fosse anedota corrente que o espírito sistematizador e dedicado dos americanos resolvesse colocá-la na vertical.

Relata o então Tenente Coronel Luiz Felipe Perdigão, no seu livro " Missão de Guerra": Evvive La Torre di Pisa, que pende, que pende...


Cantarolávamos alegres, marcando compasso com facas a bater nos copos, e pouco a pouco, a música invadia o coração, ressoando num eco infindo para encher a monotonia dos vôos longos e o vazio das noites solitárias.

Em Pisa a nossa sorte mudou. Deixamos as nossas barracas de lonas e chão batido para nos abrigar melhor, num prédio de alvenaria. Os pilotos começaram a operar já com bastante desembaraço, não obstante a perda de mais três oficiais registrados logo a seguir. Já familiarizados com a realidade da guerra, embora com a técnica e a experiência de pouco tempo, mas com a coragem e a perícia de um povo cuja vocação para a arte de voar era incontestável, isso inspirou o respeito e a admiração de quantos participou ao lado daqueles intrépidos guerreiros do ar.

Embora como foi relatado antes, a força aérea alemã estivesse varrida dos céus da Itália quando o 1º grupo de caça chegou ao Teatro de Operações, o caminho não estava de todo livre para suas façanhas. Existia ainda para obstar-lhes as investidas e reprimir os excessos de entusiasmo uma artilharia antiaérea numerosa e eficiente que, segundo, alguns, acabaram se constituindo num numeroso inimigo tão perigoso e temido quanto qualquer força aérea.

Não havia região ou ponto estratégico em poder dos alemães que não estivessem convenientemente protegidos com maior ou menor intensidade, segundo sua importância por canhões de 20, 40 e 88 milímetros.

as estatísticas demonstravam que nos primeiros meses de 1945, os aviões do 1º grupo de caça brasileiro, realizaram 1.728 surtidas. Isto representava uma glória para o pessoal de terra, de alto padrão de eficiência, pois na realidade é uma disponibilidade bem alta. Dentre os muitos alvos atribuídos ao 1º grupo de caça, nessa fase, merece especial destaque as ferrovias do Passo de Brenner e suas variantes, defendidas segundo relatório, por 408 canhões antiaéreos de grosso calibre e 415 outros de calibres diversos.

Convém aqui destacar dos efeitos mais importantes de nosso grupo. O que mais impressionou foi, sem dúvida, o realizado em princípio de fevereiro de 1945. Voltava uma esquadrilha brasileira do cumprimento de sua missão, quando assinalou, em certa região, grande concentração de caminhões. Imediatamente atacou o objetivo inopinado gastando toda a munição de suas metralhadoras. Não satisfeitos com isso, regressaram à base, reabasteceram-se de gasolina, munição, bombas de demolição e incendiárias e retornaram ao local, continuando o ataque durante longo tempo e ocasionando ao inimigo a perda de mais de 80 caminhões e ainda a destruição completa dos edifícios que estavam nas imediações.

Em fins de abril, outra esquadrilha brasileira, ao executar um reconhecimento armado, encontrou várias composições de estrada de ferro em três linhas adjacentes, partiu ao ataque, tendo como resultado tremenda explosão, pois os trens transportavam munições, as chamas se elevaram a 300 metros de altura e a fumaça a mais de 2.000 metros, as três linhas de estrada de ferro foram cortadas, mais de 70 vagões foram destruídos e muitos outros lançados fora dos trilhos.

O resultado deste ataque foi importante para as operações de nossas tropas terrestres.

Mas não só sob este prisma que queremos assinalar a ação dos nossos pilotos. Desejamos mostrar o alto grau de discernimento de que os mesmos eram dotados e para isso vamos registrar o fato ocorrido no dia 19 de abril de 1945. Este, para mim, se reveste de alto valor humano. O comandante de uma esquadrilha de nossos grupo, em regresso de missão, assinalou uma concentração de tanques numa linha muito avançada no vale do Pó e bem além da linha de segurança estabelecida. Havia, no entanto, a possibilidade remota daquelas viaturas pertencentes às tropas amigas. A notícia foi imediatamente remetida ao escalão competente e a resposta do General Thomas C. Darcy, Comandante do XXII Comando Aéreo Tático, não se fez esperar.

Solicito-vos transmitir aos pilotos do 1º grupo de caça a minha admiração pela esplêndida demonstração de senso tático e oportuno julgamento ao assinalar a presença de tanques amigos na vizinhança de Casalechio.

Essa comunicação forneceu a primeira indicação da chagada do 5º Exército no vale do Pó, e foi de inestimável valor militar para todos os interessados. O fato de não terem sido atacados estes tanques amigos, os quais se encontravam na ocasião muito além da linha de segurança, salvou a vida de inúmeros soldados aliados e constitui um tributo à perfeita doutrina do Grupo de caça brasileiro, no que diz respeito à estreita cooperação entre as forças de terra e ar.

Finalizando esta exposição sobre a atuação do 1º grupo de caça desejamos, ainda, acrescentar a operação realizada no dia 15 de abril de 1945, a qual mostra, distintamente, a cooperação do grupo às tropas terrestres de primeiro escalão. Dois dias antes, isto é, no dia 13 de abril, faleceu o Aspirante Aviador da Reserva Convocado, Frederico Gustavo dos Santos, na explosão de um depósito de munições alemão, que ele próprio metralhara, nas proximidades de Udine.

O inimigo se apresentava em Monte Solo em posições fortificadas que impediam o avanço de nossas tropas do 2º Corpo de Exército. Oito aviões brasileiros atacaram as posições com bombas incendiárias de gasolina gelatinosa e foguetes, toda a crista de Monte Solo ficou em chamas, enquanto ataques em vôo razante varriam à metralhadora, o pessoal entrincheirado. Por esta ação, o regimento de caça recebeu o seguinte elogio extensivo ao nosso Grupo.

"Desejo expressar minha apreciação e congratulações, juntamente com os da 6ª divisão Motorizada Sul Africana, pela excelente cooperação levada a efeito por sua unidade nos ataques a Monte Solo na tarde de 15 de abril de 1945".

E, para que passe à História, convém ainda, assinalar que em todas estas missões do inimigo, que eram numerosíssimas no vale do Pó. Nos quatro primeiros meses de operações, o Grupo de Caça Brasileiro fez 1.728 saídas e foi 103 vezes atingido pelo fogo da artilharia antiaérea, o que dá em média um avião atingido por 17 saídas.

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