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sábado, 5 de junho de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 27


PALAVRAS DO COMANDANTE – SOLENIDADE P-47

Exmo Sr. Brig Nero Moura, Digníssimo autoridades presentes, Senhoras e Senhores.

Prezados Veteranos,

A 18 de dezembro de 1943, por força do Decreto Presidencial nascia o 1º Grupo de Aviação de Caça formado por voluntários.

Após o treinamento no P-40 em Água Dulce, Panamá, e de P-47 em Sufforlk Field Long Island, New York, nossa Unidade desembarcou em outubro de 1944 no Teatro de Operações do Mediterrâneo, com a missão de executar tarefas de apoio às Forças Amigas de Superfície, e de Interdição.

Embora já houvesse assegurada a superioridade aérea no Teatro de Operações, a oposição da artilharia antiaérea era muito intensa e eficaz.

A famosa FLAK de 40 e os ponto 50 faziam verdadeiras cortinas de fogo tentando impedir o acesso dos aviões aliados aos objetivos vitais selecionados.

Enfrentando a FLAK inimiga, as intempéries, o desconforto da guerra, a saudade do lar distante, o afastamento de companheiros abatidos, nossos bravos souberam mostrar o valor do soldado brasileiro.

A missão era árdua, o efetivo cada vez mais reduzido, as substituições eram deficientes, a disponibilidade mantida com sacrifício e dedicação dos homens de terra, mas a fibra e a vontade de vencer eram mantidas.

Foi nestes dias difíceis, que o espírito combativo de nossos homens fez-se prevalecer ante a adversidade.

Era 22 de abril de 1945.

Nossos pilotos e homens de terra chegaram ao campo antes do amanhecer e iniciaram os preparativos para a jornada de um dia glorioso.

A névoa que encobria o campo compartilhava com nossos heróis dos brifins, das ações, das ordens, dos gestos de cada um.

Às 8h30 foi iniciada a operação com a decolagem de 3 esquadrilhas, que foram sucedidas por outras até o anoitecer.

Naquele dia a unidade teve duplicado seu esforço e conseguiram resultados notáveis que nos enchem de orgulho, e foram motivo de elogio do Comandante da 350º Grupo de Caça Aliado, propondo nossa Unidade para citação pelo Congresso dos Estados Unidos da América nos seguintes termos:

"Proponho seja o 1º Grupo de Aviação de Caça citado pelos relevantes serviços prestados no dia 22 de abril de 1945. O que realizaram nesse dia representa por si só motivo para tal citação. Entretanto, desejo ressaltar seu espírito de sacrifício desde o momento em que entraram em combate. Engajando-se na época de maior oposição antiaérea, foram suas perdas constantes e pesadas, e poucas as substituições. Com o efetivo cada vez mais diminuído, seus pilotos voaram mais, expondo-se ao perigo com maior freqüência. Em muitas ocasiões retive esses pilotos quando queriam voar mais, pois acreditava que haviam transposto o limite de suas possibilidades... Em minha opinião os ataques nesse dia prepararam o caminho para a cabeça de ponte montada pelos aliados no dia seguinte. Cada ataque foi bem planejado e executado, excedendo o 1º GP AV Ca, apesar das rigorosas perdas, a todos os outros Grupos do XXII Comando Aerotático. A superioridade do pessoal de vôo e a excelente qualidade do pessoal de terra determinaram o sucesso dessas operações".

Senhores, aquele que não cultua o passado não merece viver o presente.

O passado com suas derrotas, vitórias, alegrias, tristezas, ascensões, crises, aspirações e frustrações, é para nós fonte orientadora de nossas ações e decisões, influenciando de forma direta nossa conduta.

Daí a importância do culto aos grandes feitos da Nação, conseguidas muitas vezes com suor, lágrimas, dedicação, desprendimento, dor e sangue.

É evidente que apenas grandes homens podem superar estes fatores adversos e prosseguindo na missão alcançarem o êxito total, inconteste, irrefutável.

São estes Heróis Nacionais que hoje reverenciamos.

Terminada a II Guerra Mundial, chega ao Brasil, no Campo dos Afonsos às 10h30 da manhã do dia 16 de julho de 1945, o 1º Grupo de Aviação de Caça.

Seu Comandante, o então Tem-Cel Av Nero Moura perfilou seus rapazes, e ao apresentar sua Unidade resumiu seu relatório a duas palavras: MISSÃO CUMPRIDA.

Iniciou-se a partir de então a formação de Pilotos de Caça no Brasil.

Como seria de se esperar, uma unidade de combate, orientada e conduzida por homens desta estirpe, estaria certamente predestinada a alcançar o mais absoluto sucesso.

Desde então foram formados mais de 800 Pilotos de caça na Força Aérea Brasileira, todos formados dentro do espírito, do arrojo, do desprendimento, da perícia, da disciplina, e acima de tudo dotando a Força de homens prontos para o combate.

Companheiros Veteranos, sabemos do amor que nutrem pelo 1º Grupo de Aviação de Caça.

Nossa Unidade é para vós como se fosse um filho, uma continuação de vós mesmos.

Penso que as palavras do Coronel Mac Arthur em sua "Oração Paterna" representou tudo o que ia em vossos corações quando receberam a Missão de formar o 1º Grupo de Aviação de Caça.

A Oração diz: Daí-me um filho, Senhor, que seja forte bastante para saber quando é fraco e suficientemente bravo para ousar enfrentar-se a si mesmo quando estiver com medo; que seja orgulhoso e altivo quando honestamente vencido e humilde e generoso na vitória.

Daí-me um filho cujos desejos não tomem o lugar das obrigações; um filho que vos conheça e que saiba que o conhecimento de si mesmo é a pedra fundamental de toda sabedoria.

Guiai-o, suplico-vos, não pelos caminhos das facilidades e do conforto, mas sob o acicate das dificuldades e das exigências morais. Que ele saiba manter-se de pé nas tempestades e saiba ser compassivo para com os que fracassam.

Daí-me um filho cujo coração seja puro e cujos objetivos sejam elevados; um filho que se domine, antes de procurar dominar os outros; que se preocupe com o futuro, sem nunca esquecer o passado.

E, depois que lhe houverdes concedido todos esses dons, daí-lhe também, suplico-vos, bastante senso de humor, de modo que possa ser sério, sem levar-se demasiado a sério. Daí-lhe humildade, para que possa lembrar-se da simplicidade da verdadeira grandeza, do espírito esclarecido da verdadeira sabedoria e da meiguice da verdadeira fortaleza.

Então, eu seu pai, ousarei murmurar: NÃO VIVI EM VÃO

Queridos Veteranos, nós somos vossos filhos

Base Aérea de Santa Cruz, 22 de abril de 1980

Sílvio Potengy – Major Aviador
Comandante Eventual do 1º Grupo de Ação de Caça.

domingo, 23 de maio de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 26


CELEBRAÇÃO DA VITÓRIA

Camaradas

É com o mais justificado júbilo que celebramos hoje com os nossos valorosos aliados a vitória esplêndida que marcou o epílogo desta guerra sangrenta e impiedosa, o mais trágico acontecimento de nossos tempos e que tão profundamente feriu o mundo inteiro.

Chegamos assim, ao término de nossa jornada,longa e árdua, iniciada há sete meses, quando pela primeira vez hasteamos em solo italiano a nossa bandeira.

Distante de nossa Pátria há quase dois anos em intenso treinamento para nos adestrarmos no manejo de nossas armas, para ela estiveram voltados nossos corações e nosso pensamento, distante de nossa terra e de nossa gente, nelas buscamos a inspiração vigorosa para os nossos feitos na luta contra as forças do mal, contra o inimigo comum que tanto violentara os princípios da liberdade humana e tanto fizeram periclitar as bases de nossa civilização.

Nos campos de batalha da Europa, vós todos deste grupo de caça, como os nossos irmãos da FEB, ombro a ombro com nossos bravos aliados americanos e ingleses, elevastes bem alto o nome do Brasil.

Nos céus da Itália, escrevestes os vossos feitos gloriosos, vencendo os lances mais difíceis de nosso áspero caminho. Nos céus da Itália, ainda vibrastes na couraça robusta do inimigo golpes profundos e destruidores que de certo reduziram-lhe as forças para a luta, com vossa perícia e vosso fogo mortífero, soubestes desmoralizá-las, bloqueando-lhes, obstruindo-lhes a retirada. Realizastes esplendidamente a vossa tarefa guerreira, vós que feristes diretamente o inimigo, vós outros que afiastes as armas de nossos pilotos e tornastes possível manter nos céus inimigos as asas brasileiras.

Magnífica foi, pois a vossa atuação, cujo valor poderá ser medido ao lado do exemplo de heróica bravura e heroísmo. Espírito que nos legaram os inesquecíveis companheiros tombados por ação inimiga nos campos de batalha.

Imolados no cumprimento do dever, seus feitos e seus exemplos serão a inspiração máxima dos aviadores brasileiros. Á nossa História Militar, juntastes mais um capítulo escrito só de bravura e heroísmo, com a simplicidade dos que desconhecem sacrifícios, até a da própria vida, no cumprimento do dever.

Camaradas! Sou profundamente grato a todos vós e me orgulham o vosso valor, as vossas gloriosas realizações nesta guerra.

Comandá-los e tê-los conduzido nesta jornada que agora se encerra com grande vitória final, foi sem dúvida o maior privilégio que a mim poderia o destino ter reservado.

Itália ( Pisa), 09 de maio de 1945

Nero Moura

Tenente- Coronel-Aviador

Comandante

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 25



Aspirante Aviador Raimundo da Costa Canário – O seu avião foi atingido na manhã do dia 15 de fevereiro de 1945, quando voava integrando um esquadrilha rumo ao território inimigo, na zona de Bolonha. Inquieto, procurou olhar ao redor. Nada percebera a não ser ligeiro estremecimento e as explosões das grandes antiaéreas em torno de sua esquadrilha.

Mas, logo a seguir, percebeu que seu Thunderbolt pegava fogo. O calor já se fazia insuportável dentro da nacele a após comunicar aos seus companheiros o que sucedia, decidiu fazer a única coisa indicada para a circunstância: saltar de pára quedas.

Não sabia se voava sob território inimigo ou amigo, mas não tinha outra alternativa. Saltou e desceu lentamente para a terra. Ao chegar ao solo, desembaraçou-se do pára quedas e quando se preparava para tomar rumo viu, ainda muito longe, um grupo de soldados que corria em sua direção.

Envergavam farda verde. E a farda verde era a cor do uniforme alemão e também do brasileiro. Não gostou da atitude dos soldados que gesticulavam muito e tratou de correr em direção oposta.

Quando mais o tenente canário corria, corriam também seus perseguidores. Ouvia gritos, mas não podia perceber o significado e a distância entre ele e os soldados de uniforme verde oliva diminuía cada vez mais. Canário sentia-se perdido, irremediavelmente. Armou sua pistola calibre 45 e procurou um lugar onde pudesse, pelo menos vender caro a vida.

Súbito ouve um palavrão. Alguém o ofendera gravemente. Antônio, pára e olha para trás. Escuta mais alguns palavrões e dos mais pesados, em bom e gostoso português. Esboçava um sorriso, depois de um suspiro de alívio. Os perseguidores eram soldados brasileiros do 6º Regimento de Infantaria.

Nunca uma ofensa foi tão bem recebida pelo tenente Canário. Canário caiu na terra de ninguém, mas próximo às linhas brasileiras ocupadas pelo 6º Regimento. Os pracinhas acompanharam a descida do pára quedas e correram para auxiliar o tenente. A semelhança da cor dos uniformes é o que gerou toda a confusão.

Os pracinhas gritavam para que ele parasse, pois estava correndo em direção as linhas inimigas alemãs e dentro em pouco atingiria as primeiras posições da infantaria inimiga. Canário realizou 51 missões ofensivas.

Capitão Aviador Theobaldo Antônio Kopp – Teve seu avião atingido pelas baterias antiaéreas inimigas, no dia 7 de março de 1945, saltou de pára quedas sobre o território inimigo, caindo perto de Reggio. Os partigiani da região de Suzara regozijavam-se com a refrega que o inimigo vinha sofrendo, havia uma semana desde que certos aviões escuros com calda verde e amarela haviam descoberto e feito explodir quase todos os seus pequenos depósitos.

Quando um piloto foi obrigado a saltar, no caso Capitão Kopp, os partigiani acorreram solícitos e levaram-no para um local seguro, oferecendo-lhe abrigo até a chegada dos aliados.

Quando tanques americanos, rugindo pelas estradas, ultrapassaram a região, decidiram os partigiani que era oportuno caminhar com o Capitão ao encontro das autoridades aliadas.

Em caminho encontraram um grupo de soldados alemães retardatários. Foi só tempo de mergulharam numa vala para não receberam as rajadas lançadas pelo inimigo. Os tiros começaram a passar certeiros, matando o chefe do grupo e encurralando-os todos em evidente inferioridade. Todos menos um, que conseguira escapulir de início para buscar reforços. Não tardou muito a voltar com novo contingente, que inverteu a situação e liquidou a escaramuça. Horas mais tarde, pelo fuzilamento sumário dos remanescentes germânicos.

No último dia de fuga Kopp roeu assim momentos amargos, que quase lhe levaram a sorte por água abaixo. Quase... Realizou 58 missões ofensivas.

1º Tenente Aviador Othon Corrêa Netto – Abatido no dia 26 de março de 1945. Liderando a esquadrilha através de mau tempo conduziu-a corretamente até à ponte de Casarça, onde efetuaram bombardeio picado, com intensa reação antiaérea.

Corrêa Netto voltou então, para atacar a foguetes as posições de artilharia, ocasião que fora atingido, usou o pára quedas a uns 1500 metros de altura, quando o avião começou a incendiar-se.

Havia esperanças que se foragisse, porque constava existirem partigiani na área. Esteve realmente por um triz, mas terminou prisioneiro. Tocando o solo, escondera-se com o pára quedas em meio ao capim alto, percebendo soldados por todo canto, a esquadrinhar cada palmo do terreno.

Civis, que passavam, olharam-no cheios de simpatias, como quem pede desculpas por não poder ajudar, e seguiam adiante taciturnos. Aconteceu o inevitável, foi feito prisioneiro, seguiu o caminho já antes percorrido por Motta Paes e Assis, através do passo de Brenner.

A mesma visão de ruínas e ódios, o mesmo tratamento cada vez pior os longos e estafantes interrogatórios.

Regressou ao grupo a 15 de maior de 1945, depois de ter sifo libertado pelas tropas aliadas. Foi abatido na sua 58ª missão ofensiva.

2º Tenente Aviador Armando de Souza Coelho - Abatido no dia 19 de abril de 1945, quando regressavam de uma missão de bombardeio a um quartel general de uma divisão inimiga que opunha resistência ao avanço do Oitavo Exército.

O tenente Armando teve seu avião atingido no sistema de lubrificação e continuou voando já sem óleo, no desesperado esforço para alcançar território aliado na altura de Revenna, ocasião que usou pára quedas, com sucesso, cinco milhas ao norte daquela cidade, dentro das linhas amigas.

Vale salientar que o tenente Armando terminou a guerra ileso, apesar de ter sido o piloto mais atingido pela antiaérea. Realizou 62 missões ofensivas.

2º Tenente Aviador Marcos Eduardo Coelho de Magalhães – Abatido pela artilharia antiaérea a 22 de abril de 1945. Saltou de pára quedas, mas quando se aproximava do solo começou a sentir que estava servindo de alvo aos fascistas que abaixo se aglomeravam. Começou a fazer evasivas com o pára quedas e não pode evitar sua queda sobre o telhado de uma casa e a conseqüente fratura dos tornozelos.

Aprisionados dele se aproximou um oficial italiano que ameaçava com uma arma. Naquele momento, um cabo alemão interferiu em favor do piloto brasileiro, não permitindo que o italiano continuasse com as ameaças. Fez transportar o tenente Coelho, embarcando com ele no caminhão e levando-o para um hospital nas proximidades de Reggio.

Aí, o brasileiro foi tratado como verdadeiro hóspede de honra, coisa que certamente o intrigava, até o dia em que, sendo procurado pelo diretor do hospital, passou a compreender a razão de ser daquilo tudo.. Explicara-lhe o médico alemão que, devendo abandonar o hospital, imediatamente, seria forçado a deixar ali os feridos acompanhados de dois serventes, pois não tinha meios para retirá-los.

Passados alguns dias chegaram os partigiani, tendo o tenente Coelho tomado a si, o encargo de evitar que os enfermos alemães fossem maltratados pelos italianos.

O médico nazista tivera razão ao ser tão cauteloso e nosso piloto, mesmo ferido, teve oportunidade de salvar muitas vidas. Foi abatido na sua 85º missão ofensiva.

2º Tenente Aviador Renato Goulart Pereira - Teve seu avião atingido a nordeste de Treviso, no dia 30 de abril de 1945, pouco além das linhas aliadas, que já alcançavam a região.

Tentou alcaçá-las seu guia de esquadrilha, voava mais baixo, observava bem o que ocorria, os cofres de munição atingidos pela face inferior se incendiavam, em risco talvez de decepar a asa.

Mas, nossos exércitos estavam tão perto que valia a pena insistir, conseguiu restabelecer a calma no Goulart, assegurando-lhe ir tudo em ordem. Logo depois, porém ultrapassando de vez o inimigo ajuntou entre aliviado e cínico. Bom agora é saltar, porque o seu avião está pegando fogo. Não foi preciso segundo aviso. O Tenente Goulart saltou de pára quedas a oeste de Lago camacchio, sendo recolhido pelas tropas inglesas. Realizou 93 missões ofensivas.






domingo, 16 de maio de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 24


PILOTOS ABATIDOS, APRISIONADOS E REFUGIADOS, QUE EFETUARAM SALTOS DE PÁRA-QUEDAS EM TERRITÓRIOS INIMIGOS E AMIGOS


Quando o piloto tinha seu avião atingido pela bateria antiaérea, que o obrigavam a saltar de pára-quedas, várias coisas poderia acontecer: ser logo aprisionado pelos alemãs, refugiar-se com auxílio dos patriotas italianos, acidentar-se ou perder a vida, durante o salto. Todas essas situações, realmente aconteceram.


O 1º Tenente Aviador Ismael da Motta Paes, foi abatido nas proximidades de Ostiglia, em 23 de dezembro de 1944.


Atingido por metralhadoras em vôo rasante, cruzou o Rio Pó em direção ao sul, tentando regressar, seguido pela esquadrilha; chegou a informar aos seus companheiros de vôo que a pressão de óleo e gasolina caía e que já havia alijado o canopy. Sendo essas suas últimas palavras pelo rádio. Saltou de pára quedas na altura de 1.000 metros e teve a pouca sorte de cair num canal de irrigação, tomando de início um banho gelado. Com muito custo, nadou até uma margem e saiu andando sob olhares de pessoas curiosas, que não auxiliavam, mas não hostilizavam. Como era de se esperar, viu-se cercado de soldados alemães, que o prenderam.


Foi conduzido ao campo de interrogatório de Frankfurt. Nada revelou fora do permitido: o nome, o número e a nacionalidade. De Frankfurt fora levado para o campo de concentração de Stettin, na Prússia, onde permaneceu até março de 1945, quando foi libertado por tropas soviéticas, sendo o último a regressar ao nosso acampamento. Foi abatido em sua 24ª saída ofensiva.


O 1º Tenente Aviador Josino Maia de Assis, teve seu avião atingido pelas baterias antiaéreas no dia 21 de janeiro de 1945, que o obrigou a saltar de pára quedas em território inimigo, na região de Piacenza.


Ao atingir o solo, foi cercado por um grupo de soldados Mongóis, carrancudos e ferozes, metidos em fardas alemães, onde abriram fogo contra ele que estava desarmado e com os braços levantados, na posição clássica e inconfundível dos que se rendem. Os amarelos, entretanto, pareciam não ligar para isso e continuaram atirar, felizmente com péssima pontaria, até que surgiu um oficial alemão que os repreendeu severamente e impediu que se consumasse um crime contra um homem desarmado.


Os amarelos eram soldados da Mongólia. Lutavam metidos em uniformes alemães em troca de comida e roupa. Eram ferozes e cruéis, verdadeiros mercenários da morte. Estavam na frente italiana, batalhando as forças do V e do VIII exércitos aliados. Prisioneiro, o tenente Assis foi mandado para campos de concentração no interior da Alemanha.


No primeiro deles, mas proximidades de Frankfurt,foi submetido a rigoroso interrogatório. Depois, foi transferido para Nuremberg onde permaneceu cerca de um mês em uma stalag, onde o frio era insuportável, não havendo higiene, faltando alimentação. Ali, só resistiam os homens robustos.


Com o avanço das tropas aliadas todos os prisioneiros foram transferidos para outras stalags, mais para o interior da Alemanha. Obrigaram-nos a caminhar a pé, muitas milhas debaixo de chuva, sem alimentação, sob ameaças de guardas da Gestapo e cachorros amestrados para guardas de prisioneiros. Numa dessas caminhadas, encontrou-se com outro oficial do grupo, também prisioneiro, o Tenente aviador Othon Corrêa Netto.


A caminho de Moesburg, perto da fronteira da Suíça sofreram horrores. Muitos dos prisioneiros morreram à míngua ou foram assassinados por impiedosos guardas, que atiravam ao menor gesto de rebeldia ou atraso, nas estafantes caminhadas. Em Moesburg, encontrou-se com oficiais da FEB e com grande número de pracinhas, internados num imenso campo de concentração. Ali o tratamento era melhor que nos outros lugares, graças à internação da Cruz Vermelha Internacional. O tenente Josino Maia de Assis, foi abatido em sua 41ª saída ofensiva.


Capitão Aviador Joel Miranda – Comandante de Esquadrilha, foi abatido a 4 de fevereiro de 1945. Após ter executado um bombardeio avista uma locomotiva correndo a todo vapor, ocasião em que correu para metralhá-la seguido de perto por Danilo. Castel-franco, entroncamento a sudeste de Treviso, temido na época pela concentração de Flak que a defendia. A barragem dos 20 milímetros começou de repente, anuviando por completo o céu, foram ambos atingidos e saltaram simultaneamente, como informou Mocelin, mas só o pára-quedas de Joel chegou a ser visto aberto. Dificilmente escapariam da morte ao cair prisioneiros, porém a guerra é feita de imprevistos, e foragiram-se ambos.


Ao abandonar o avião, em pára-quedas, teve a infelicidade de partir um braço e depois, ao tocar o solo, destroncou um pé. Suas possibilidades de fuga tornaram-se, então, muito reduzidas, tanto mais que, as pessoas a quem encontrou de início , não queriam prestar-lhe auxílios efetivos, limitando-se a indicarem o caminho que deveria seguir. Assim o Capitão mesmo acidentado andou horas e horas sem destino certo até encontrar uma casa onde lhe deram acolhida e roupas civis. Dali saiu horas depois, acompanhado e auxiliado por um soldado sul africano, ex-prisioneiro dos alemães, que havia bastante tempo se encontrava na região, foram assim ter a um grupo de partigiani, que nas vizinhanças de Pádua, os alojou até o fim da guerra.


O braço partido, sem cuidados médicos por muitos dias, gerara complicação, e para salvar o braço, Joel não teve dúvidas, arriscou outra vez a vida. Foi ao hospital alemão, que estava instalado nas adjacências de Pádua, acompanhado por uma valente moça partigiana, ambos disfarçados num casal de pacotes lavradores. E como a primeira radiografia não ficasse boa, voltou outra vez, arriscando a pele, na ânsia de engessar o braço. E conseguiu. Ficou entre os partigiani, até o fim da guerra, trabalhando e contando coisas do Brasil. Conquistou todo mundo e, quando as tropas aliadas libertaram o Norte da Itália, o Capitão Joel foi encontrado gordo, feliz e admirado por todos. O capitão Joel Miranda foi abatido em sua 31ª saída ofensiva.


2º Tenente Aviador da Reserva Convocado Danilo Marques Moura – Abatido em 04 de fevereiro de 1945, com o capitão Joel, a sudeste de Treviso.


O tenente Danilo conseguiu evitar seu aprisionamento numa região fortemente controlada pelos alemães, ficou logo obcecado pela idéia de voltar ao grupo. Saltando de pára-quedas, ao tocar o solo, mordeu a língua. Por maiores esforços que fizesse não conseguia articular a palavra. E isto o salvou de cair prisioneiro dos alemães, embora tivesse permanecido várias semanas em território inimigo, encontrando-se diariamente com tropas de infantaria nazistas.


Ocorre que tão logo conseguiu desembaraçar-se do seu pára-quedas, foi cercado por contadini ( camponeses) italianos que o socorreram e lhe ofereceram roupas, a fim de tratar de escapar dos alemães, que rondavam na proximidades.


Bem alimentado, pôde dormir na casa de um deles, e assim, metido em roupas civis iniciou sua caminhada para o sul.


Encontrou-se, várias vezes com tropas inimigas. Cumprimentava com humildade os oficiais, sargentos e soldados nazistas e quando obrigado a se identificar defendia-se como podia, sempre apontando a língua ferida, que o impedia de falar desembaraçadamente. Fingia-se também afetado pelos bombardeios.


Conseguiu chegar às margens do Rio Pó. Ali encontrou uma barreira praticamente intransponível, poderosas forças alemãs guardavam a região e era impossível a passagem para a outra passagem.


Resolveu então jogar uma grande cartada. Procurou um lenhador italiano e expôs-lhe leal e francamente sua situação. Este resolveu ajudá-lo. Era amigo de um cabo alemão encarregado da guarda do rio, naquele trecho, disse-lhe. Depois de muita conversa, o lenhador convenceu o alemão de deixar passar o rio, sem dizer que se tratava de um oficial aviador brasileiro. Era travessia de mais um stolati (fugido da guerra) rumo ao sul, pedalando uma bicicleta que lhe foi dada pelo lenhador italiano.


O Tenente Danilo continuou a dirigir-se sempre rumo ao sul, à medida que se aproximava dos Apeninos encontrava sempre maior quantidade de tropas inimigas. Chegou ao ponto crítico. Impossível transpor a barreira sem auxílio.


E mais uma vez, o tenente Danilo jogou uma cartada decisiva. Os italianos que haviam encontrado pelo caminho recomendaram a Danilo que jamais confiasse em gente de boa aparência. Procurasse, sempre que necessário gente humilde, de preferência os contadini. Estava meio desesperado e desesperançado de atingir nossas linhas e, ao passar por uma pequena cidade viu na janela de um andar superior, uma senhora de aspecto próspero, que dizia crochet.


Sentiu qualquer coisa que não sabe explicar até hoje. Num ímpeto subiu as escadas e surpreendeu-se a contar, à senhora italiana, a sua odisséia.


A sorte o ajudou e na mesma noite, o marido da bondosa senhora o punha em contato com patriotas italianos escondidos nas proximidades. Os partigiani o ajudaram. E em pouco tempo, conseguia transpor as linhas inimigas, com um magote de verdadeiros stolati, para se identificar a um oficial aliado, mal refeito da surpresa ao encontrar um oficial brasileiro entre os refugiados de guerra.


Não fosse a mordedura providencial de sua língua, talvez tivesse caído prisioneiro e mandado para um campo de concentração. Danilo caminhou 400 quilômetros em 23 dias. Foi abatido na sua 11ª saída ofensiva.


1º Tenente Aviador Roberto Brandini – Atingido por metralhadoras ao norte de Ostiglia. As granadas antiaéreas estouravam com fragor, enegrecendo de fumaça o céu límpido e fazendo o P 47 pilotado pelo tenente Roberto Brandini, já incendiado, estremecesse em toda a sua estrutura naquela manhã do dia 10 de fevereiro de 1945.

Brandini logo percebeu que a situação era insuportável. Seu Thunderbolt não poderia mais se manter no ar. Abriu a capota da nacele e saltou em meio a pavorosas explosões de granadas, ou melhor, dos flaks. Sentiu um impacto violento na cabeça. Perdeu os sentidos e veio descendo, lentamente em meio áquele inferno de ferro e fogo.


Quando voltou a si sentiu dores horrorosas na cabeça e ainda muito confuso, percebeu que estava banhado em sangue. Olhou em volta e verificou algo que fez gelar.


Estava sendo amparado por um saldado alemão, sentado na almofada traseira dum veículo. Num relance, percebeu tudo. Estava prisioneiro e pior, gravemente ferido na cabeça. Um dos estilhaços que voavam em volta do seu avião havia atingido sua cabeça, quando saltara de pára-quedas.


O carro parou. Levaram-no para um dispensário, onde ficou até ao anoitecer, quando uma ambulância o transportou para um hospital de guerra almão, especializado em ferimento de crânio.


No dia seguinte foi operado por equipe de cirurgiões alemães. Foi feita a trepanação no seu crânio e extraído um fragmento de 4 centímetros quadrados.


Permaneceu no hospital por longo tempo, recebendo sempre tratamento humano por parte dos alemães.


Mais tarde, já convalescente, foi levado para um hospital presídio nas proximidades de Verona e de lá para Mantua.


Já restabelecido enviado para um horroroso campo de prisioneiro onde ficou pouco tempo, pois o avanço aliado obrigou sua remoção com outros prisioneiros, para Bolzano nos Alpes, donde foi libertado pelas tropas americanas.


A técnica cirúrgica alemã salvou-o da morte certa e o tenente Brandini recorda-se com gratidão dos cirurgiões e enfermeiras alemães que o trataram com humanidade e devoção durante o tempo em que esteve internado no hospital militar. Foi abatido em sua 28ª missão ofensiva e regressou ao grupo a 8 de maio de 1945.

domingo, 25 de abril de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 24


PILOTOS QUE FIZERAM POUSO FORÇADO EM BASE ALIADA

1º Tenente Aviador – Rui Barbosa Moreira Lima – Pertencia à esquadrilha Verde. Dia 11 de março de 1945 decolaram duas esquadrilhas, a verde e a vermelha sob o comando do Capitão Newton Lagares Silva com finalidade de bombardear a já muito conhecida ponte ferroviária de Casarsa. A referida ponte estava situada numa área muito bem fortificada, contando com uma eficiente artilharia antiaérea alemã.

As esquadrilhas chegaram à Casarca na hora estabelecida segundo ordem de missão.

Inicia-se o bombardeio da ponte, tendo em vista sua destruição. Mergulha o Comandante das esquadrilhas Capitão Lagares, que é seguido pelo Tenente Roberto Tormim. No momento em que o 3º elemento, Tenente Rui iniciava o mergulho, descobriu uma bateria de 88 alemã, localizada a uns 200 metros da ponte.

O tenente Rui avisou pelo rádio Jambock Verde de Jambock 3, localizei uma bateria. Vou atacá-la antes de lançar minhas bombas. Boa Sorte, replicou Lagares.

Como era de esperar, foi recebido festivamente, não somente pela bateria que estava atacando, como também por outras armas de baixo calibre, cuja defesa acionou ainda os seus terríveis canhões antiaéreos de 40 e 20 milímetros.

Na recuperação, quando estava a uns 3.000 pés, o motor do avião D-4 foi atingido, danificando dois cilindros. O motor começou a pegar fogo. Avisou ao Comandante o que estava se passando. Jambock Verde foi atingido, o avião está pegando fogo, vou continuar o ataque sobre a bateria e saltar de pára-quedas em seguida.

Transmitiu sua mensagem, Jambock Verde, estou com fogo a bordo, vou agora lançar minhas bombas sobre a ponte entregando-as a domicílio usando essa gíria e depois saltei.

Por sorte, no momento em que sobrevoava o alvo, estava parado sobre a ponte, um trem alemão. As bombas dos setes aviões que me antecederam, pegaram a área do alvo, mas não atingiram o objetivo. Como fui fazer entrega das bombas à domicílio acertei em cheio. O trem era um transporte de munição. Uma festa Pirotécnica. A explosão das duas bombas de 500 libras do meu D-4 miisturaram-se com as explosões do trem.

Cumprira a missão, com a destruição da ponte. Transmitiu nova mensagem. Jambock verde é o Jambock 3, vou saltar, a visibilidade é zero. Pois além do fogo, há óleo sobre o pára-brisa cobrindo também o Canopy e fumaça na nacele. Acionou o motor, levantou o nariz do avião, e quando estava à altura de 8.000 pés, se preparou para saltar.

Naquele instante ouvi a voz calma do Lagares. Não vai saltar coisa nenhuma, o fogo antiaéreo te pegará durante a queda, toma o rumo 150 que te avisarei quando deves saltar. É uma ordem, não salta agora há flak demais em torno do teu avião, estão te caçando, é besteira saltar agora. Outras vozes chegaram aos meus ouvidos. Não salta arataca. A solidariedade dos companheiros e a voz experiente de Lagares, clarearam minha cabeça. Está bem. Leva-me para outro local mais seguro. Vou na reta, sempre subindo, seguindo as instruções de Lagares. Não via nada de fora. Era um Vôo por instrumentos. Atendendo ao Comando de Lagares, com aquela boa cabeça que deus lhe deu, fui guiando rumo a Forli, uma base de Bombardeiros Poloneses da RAF. Quando estava a mais de um minuto da cabeceira da pista, em altura conveniente, Lagares disse-me, que eu estava alinhado com a pista, devendo cortar o motor à sua ordem.

Aí entrou São Tomé. Quis conferir. Pus os óculos de vôo, abri o canopy e estiquei o pescoço para fora. Num gesto lusitano tirei os óculos e insisti. Desta vez paguei caro. A vista esquerda foi atingida, pelo óleo quente. Já estava quase no chão. A oredem para cortar o motor veio rápida. fazê-lo deslizar sobre a pista, foi questão de um piscar de olho. Fiz uma aterrissagem sem rodas, pois tanto eu quanto Lagares, não queríamos correr o risco de varar a pista com o perigo de uma possível explosão.

O avião correu o suficiente para parar a uns dez metros do seu final. Depois daquele barulho infernal da lataria deslizando sobre uma pista de emergência feita de grades de ferro. Deixei o avião as carreiras. Ainda havia o perigo de uma explosão. Afastei-me o quanto pude. Sentei-me sobre o pára-quedas a uns 100 metros tremendo mesmo, a vista esquerda no escuro, aguardando o socorro que vinha representado por um carro contra incêndio, uma ambulância e um jipão. Quem me descobriu primeiro foi o jipão. Sobre o capô do mesmo vinha sentado um oficial da RAF. Loiro, alto mais ou menos 1,80m, perguntou, Brasileiro?. Caí das nuvens de alegria e não imaginava que naquela altura dos acontecimentos fosse encontrar um inglês da RAF falando português.

O médico polonês que me atendeu foi gentilíssimo e eficiente. Ali mesmo fez a faxina no olho esquerdo. Com um chumaço de algodão molhado em líquido amarelo, limpo-me a vista. Doeu para burro. Antes que eu visse qualquer coisa, pôs-se um tampão no olho esquerdo.

Um B 25 pilotado pelo Major Marcílio Gibson, me recambiou para minha base em Pisa.

Por causa dessa missão, o Governo Americano conferiu-me uma medalha de guerra a DFC – Distingshed Flying Cross – que corresponde à Cruz de Bravura no Brasil. O Tenente Rui realizou 94 missões de guerra.






O 2º Tenente Av. ES. Conv. Alberto Martins Torres, regressava de uma missão no vale do Pó, em condições do mau tempo. Vínhamos no colo do controle do radar de terra que nos guiava por dentro das nuvens em vôo por instrumentos, em Esquadrilha. Comandava Capitão Lafayete co Keller de número dois, eu de três e o Mocelin de número quatro. O Vôo era penoso, pois havia alguma turbulência. Em dado momento começaram a espocar, dentro das nuvens salvas de 88 de algumas baterias antiaéreas alemãs já então reguladas pelo radar. Numa das ações evasivas executadas pela esquadrilha, sobrou em ala, o Mocelin. Perdeu-nos de vista dentro do espaço caldo cinza da nuvem e prosseguiu por conta própria, guiado pelo radar de terra. Numa outra guindada mais brusca sobrei eu. Pela direção que me indicou deduzi que já iniciava a travessia do maciço dos Apeninos. Voava tranquilamente a uns quinze mil pés dentro do denso colchão de nuvens. Tudo em ordem e funcionando bem. Só a gasolina é que não era muita. Um pouco preocupado com a gasolina, resolvi comunicar-me com COOLER – código da estação de radar de terra, para averiguar sobre a distância a que eu estaria da base. Tentei inutilmente, silêncio total. Tive uma estranha sensação de desamparo. Passei para outros canais do transceptor VHF e nada. Conclusão simples e incômoda, pifara o meu único meio de comunicação com terra. Calculava a gasolina para mais ou menos méis hora de Vôo. Como já nesta altura, a gasolina era pouca, precisava tomar decisões urgentes. Mentalmente procurei reconstituir os rumos que nos haviam sido determinados pelo controle de terra, para deduzir minha posição aproximada. Cálculos de orelhada, nada confiáveis. Pela última proa e pela altitude sabia apenas que deveria estar atravessando os Apeninos em direção ao sul. Calculava a gasolina para mais ou menos meia hora de Vôo. Resolvi, mais dez minutos no rumo sul para aumentar as chances de já ter transporto a serra, depois rumo oeste, para a direita, em direção ao litoral de Livorno, descendo, e logo que furasse o colchão, já sobre o mar, meia volta volver e procurar chegar a Pisa que fica próxima ao litorial.

O Plano tinha como pontos principais, primeiro descer sobre a água sem perigo de colisão com os morros, pois não sabia qual o teto e segundo, caso acabasse a gasolina antes de alcançar o litoral seria mais fácil pousar de pago na água e me safar no bote salva vidas inflável que lavávamos no assento do pára quedas. Assim fiz. Os dez minutos no rumo sul pareciam não passar, enquanto me atormentavam as dúvidas da transposição dos Apeninos e da marcação do combustível. Afinal guinei para a direita tomando a proa oeste, rumo ao mar? Será... fui interrompido nestas aflitivas conjecturas por um valor mais contundente que se alevantavam, começou a piscar aquela luz vermelha no painel, conhecida como olho da bruxa, que indicava ao piloto dever esgotar-se o combustível num prazo aproximado de quinze minutos! Estaria neste momento ainda a uns três mil metros, descendo para oeste. Não havia mais escolha, precisava passar para debaixo do colchão para poder tomar outras decisões. De saída, eu nunca havia saltado de pára quedas e despojar-me naquele espaço cinza sem horizonte, sem céu nem chão, era forte demais para o meu aparelho gástrico.

E ainda mais, aquele negócio de saltar de pára quedas, assim a sangue frio, além de ser muito chato, ainda tinha implicações de ordem sentimental de profundas raízes. Ea graça? E meu P 47 ? Cião bello, que eu fico por aqui...? Tout Court! Que é isto! Pois aquela garça era minha e eu também pertencia a ela com o seu A4 meio desalinhado pintado no capô. Além do mais, aquele P 47 me levava e trazia, inteiro, das missões, mesmo quando o acertaram de mau jeito, como aquele dia que pousou em Pisa banhado de óleo que lhe escapava do motor atingido, mais que, até me depositar seguramente na pista, havia continuado pulsando firmemente, sem esmorecer. E depois além daquele A4 ser meu cupinhcha, meu curriola, ele não pertencia só a mim. Ele pertencia ao Sargento Argolo, seu mecânico e seu auxiliar, Cabo Torres e toda a equipe que municiava e dele cuidava. E, como logo perceberia, não era só o A4 que pertencia a eles, era seu também, assim como todos os pilotos pertenciam ás equipes de terra, da mesma forma que a meninada sempre pertencia a toda família e aos seus agregados. Por isso cuidavam com tanto carinho de nós pilotos e dos nossos aviões. As nossas ações e o que acontecesse conosco podia ser motivo de grandes alegrias ou de grandes tristezas para aquela grande família que aguardava sempre ansiosa e preocupada com nosso regresso das missões.

Não pretendo inferir que todas essas considerações se houvessem apresentado analiticamente no momento de decidir o que fazer. Não. Tudo aquilo já estava embutido na gente e representava a nossa verdade. No momento de decisão, parti, forçosamente, das minhas verdades.

Por isso, nada de saltar de pára quedas, nada de rumo sul. Continuar para oeste e como o olho da bruxa não sossega, nariz embaixo para varar esta porcaria destas nuvens o mais depressa possível. Porque esta decisão? Intuição só isso. Uma coisa era certa, a parte mais alta do espinhaço dos Apeninos já havia ficado para trás. Quinhentos quatrocentos o cinza compacto e homogêneo começa a assumir umas sombras escuras. Todo piloto conhece esse sintoma em que está alcançando a base das nuvens.

Apesar da insistência da luz da gasolina, eu já tinha mais calma para avaliar a situação. Aquele rio era, sem dúvida o Arno, o mesmo que passa na porta do Albergo Nettuno em Pisa, nosso alojamento. Estava a caminho de casa. O problema passava a ser bem mais simples, seguir o rio, e rezar para que a gasolina desse para chegar. Eis que surge na margem esquerda uma pista. De bom tamanho e, como o avião estava leve, sem bombas e sem gasolina, não havia o que esperar. Trem embaixo, flap totalmente estendido, reduzir o passo da hélicd, acelerar para manter a velocidade de aproximação, dependurado no motor, uma pequena entortada para alinhar com o eixo da pista e ... terra firme! Surge um jipe quadriculado de amarelo e preto, tradicional Follow me ( siga-me) e me guia para o pátio de estacionamento. Nesta rolagem segui aquele jipe taxiando devagar com as pernas bambas, a ponto de só conseguir controlar os freios com dificuldade.

Era uma base de esquadrões da RAF. Convidaram-me para tomar chá na sala dos pilotos. Contei o que houve. Localizei-me na carta da região. Estava na margem do Rio Arno, a uns quinze minutos de vôo de Pisa, a nossa base. Tive certa dificuldade em convencer os ingleses a abastecer meu avião e a me deixarem seguir caminho para casa. A minha ânsia de volta à base os acabou convencendo de que era inúltil apelar para bom senco de quem de britânico só demonstrava um relativo domínio do idioma. Agradeci a acolhida e pau no burro.

De tanque cheio e sabendo por onde andava, aqueles quinze minutos de vôo rasante até Pisa foram um salutar passeio para sacudir as aflições anteriores. Um cisca confiante naquele meu A4 verde escuro um pouco arranhado e machucado, cujo avestruz arranhado na bochecha esquerda e o verde e amarelo na cauda, os ingleses, como a mim próprio, haviam fitado com um misto de estranheza e de respeito.

BLACK BALL TOWER- JAMBOCK RED THREE-PANCAKE-OVER ROGER JAMBOCK RED THREE – CLEAR TO LAND – BLACK BALL OUT.

Rolei para o estacionamento. Desta vez as pernas estavam firmes. Desafivelei a máscara de oxigênio e exibi a dentadura completa para o Sargento Argolo que estava de pé na asa à meu lado. Junto do avião havia um grupo das equipes dos outros aviões da RED – Alguém gritou e os outros tenente?

O Tenente Torres realizou 99 missões de guerra.

domingo, 18 de abril de 2010

LEMBRANÇAS E RELATOS DE UM VETERANO DO 1º GRUPO DE CAÇA - Parte 23


PILOTOS MORTOS EM COMBATES, NA ITÁLIA, ABATIDOS PELAS ANTIAÉREAS INIMIGAS

1 – 2º Tenente Aviador John Richardson Cordeiro e Silva - em combate no dia 06 de novembro de 1944.









John Richardson Cordeiro e Silva, 1º Tenente (post-mortem), nascido no dia 29 de setembro de 1922, filho de Antônio Cordeiro e Silva e D. Leonice Richardson Cordeiro e Silva. Sentou praça no dia 03 de junho de 1941. Faleceu em combate na Itália no dia 06 de novembro de 1944..

Teve quatro citações e desempenhou missão de guerra. Agraciado com as seguintes medalhas: Campanha da Itália, Cruz de Sangue, Cruz de Bravura. Sepultado em Pistóia.

Suas cinzas repousam no monumento aos mortos da segunda guerra mundial.

Tenente Aviador John Richardson Cordeiro e Silva, abatido no dia 06 de novembro de 1944, quando atacava uma posição de artilharia nos arredores de Bolonha, integrado uma esquadrilha de quatro aviões do 345º Esquadrão de caça Norte Americano. Esse esquadrão era conhecido pelo seu arrojo e experiência em combate. Nada respeitava e tanto isso é verdade, que não respeitaram a inexperiência de Cordeiro.

Levaram-no a Bolonha, a cidade mais bem defendida pela antiaérea do vale do pó, para realizar um ataque rasante, após um bombardeio picado em qualquer ponto do Norte da Itália.

Bolonha aparecia nas cartas de navegação, assinalada por uma enorme mancha vermelha, sinal irretorquível de que estava bem defendida.

O Tenente Cordeiro, conhecia muito bem a situação. Entretanto não vacilou em enfrentá-la, até que em dado momento, começou a distinguir nas proximidades do seu aparelho, em vôo vertiginoso, pequenos rolos de fumo branco e negro característicos das explosões das granadas de 20 e 88 milímetros.

Um veterano, talvez tivesse se esquivado de fazer nova passagem sobre o alvo, porém o jovem e briosos oficial, com tanta bravura, não vacilou em empreendê-la, ocasião em que o alvejaram.

Pelo rádio ainda comunicou ao Comandante da esquadrilha que seu avião lançava fumaça, mas o motor funcionava bem.

Em seguida nova mensagem: O aparelho estava incendiando e que iria abandoná-lo. Não chegou porém a fazê-lo, morrendo preso à nacele da sua máquina em chamas.

Perdia o Brasil seu primeiro piloto em operações de guerra. O Boletim do Grupo assinalou com Justiça: O desaparecimento do Tenente Cordeiro causa a todos nós profundo pesar pela perda dum amigo, ótimo oficial e excelente piloto. Mas deixa conosco o maravilhoso exemplo de sua indômita coragem e do sacrifício da vida pelo mais alto dos ideais: A Pátria.

2 – 1º Tenente Aviador João Maurício Campos de Medeiros – em combate no dia 02 de Janeiro de 1945.









João Maurício de Medeiros, Capitão Aviador (post-mortem), nascido no dia 15 de abril de 1921, filho de Maurício Campos de Medeiros e de D. Mariana Isabel da Silva Lobo Medeiros. Sentou praça no dia 30 de setembro de 1942. Faleceu em combate, na Itália no dia 2 de janeiro de 1945.

Obteve seis citações e desempenhou 32 missões de guerra. Agraciado com as seguintes medalhas: Campanha da Itália, Cruz de sangue, cruz de aviação (Fitas A e B), Cruz de bravura e AIR Medal (com um cluster).

Sepultado em Pistóia. Suas cinzas repousam no monumento aos mortos da segunda guerra mundial.

Sumário da missão nº 138, durante a qual foi abatido o segundo tenente aviador João Maurício Campos de Medeiros.

Às 8h40m do dia 2 de janeiro de 1945, 4 aviões deste grupo decolaram sob o comando do 1º tenente aviador Ismar Ferreira da Costa, a fim de realizarem um esclarecimento armado na área delimitada pelas seguintes cidades; Piacenza, Brescia, Bergamo, Turim, e Gênova. Após terem bombardeado uma ponte de estrada de rodagem sobre o rio Vara a NE de Spezia, a esquadrilha seguiu para Gênova, iniciando daí em direção ao N o esclarecimento da área que lhes havia sido designada.

Às 10h15m, próximo à cidade de Alexandria, uma locomotiva e vários vagões que ali estavam estacionados, foram atacados, o que provocou fortíssima reação da artilharia antiaérea inimiga.

Nessa ocasião , o piloto do quarto avião da esquadrilha, 2º tenente aviador João Maurício Campos de Medeiros, comunicou pelo rádio que seu avião estava pegando fogo e que ele ia lançar-se de para quedas. Ainda sob intenso fogo antiaéreo, o que dificultava uma observação mais cuidadosa, os demais pilotos da esquadrilha puderam ver que o avião do tenente Medeiros ganhava altura rapidamente, voando já cerca de 1.000 metros, deixando grosso rastro de fumo preto e que, ao atingir 1.200 metros aproximadamente, mergulhou quase verticalmente até explodir de encontro ao solo. Não foi possível aos demais aviões permanecerem no local, a fim de verificarem se o tenente Medeiros havia saltado de para quedas, devido ao intenso fogo antiaéreo que ainda persistia.

Considerando-se que o avião foi visto cair desgovernado de mais de 1.000 metros de altura e a resolução já tomada pelo piloto de lançar-se de para quedas, tudo leva crer que assim haja procedido, a menos que tenha sido ferido antes de poder fazê-lo.

Relata o então Tenente coronel aviador Luiz Felipe Perdigão, no seu excelente livro Missão de Guerra. Ninguém viu o para quedas abrir, e uma incógnita pendurou até dez dias depois, quando o rádio de Berlim deu Medeiros e Motta Paes como prisioneiros.

Então foi verdadeira festa, com alegria de sabê-lo vivo, só desmentida após o término da luta, pelas evidências colhidas no próprio local da queda. O rapagão de rosto redondo que filosofava, ante um copo de vinho e uma gargalhada sonora – viver pouco, mas viver intensamente – cumpria seu vaticínio.

Sim, o para quedas chegara a abrir, mas apenas em tempo de lançá-lo sobre fios de alta tensão, onde encontrou a morte. E a rádio nazista, para quem tudo valia em matéria de propaganda, bem se vê que não perdera tempo.

3 – 1º Tenente Aviador Aurélio Vieira Sampaio – em combate no dia 22 de janeiro de 1945.









Aurélio Vieira Sampaio, Capitão Aviador (post-mortem), nascido no dia 31 de maio de 1923, filho de Lauro Sampaio e de D. Cansuuelo Veira Sampaio.

Sentou praça no dia 1 de abril de 1940. Faleceu em combate na Itália no dia 22 de janeiro de 1945.

Teve cinco citações e desempenhou 17 missões de guerra. Agraciado com as seguintes medalhas de campanha da Itália, Crus de Aviação (firas A e B), Cruz de sangue, Cruz de bravura, campanha do Atlântico Sul e AIR Medal.

Sepultado em Pistóia. Suas cinzas repousam no monumento aos mortos da segunda guerra mundial.

1º Tenente Aviador Aurélio Vieira Sampaio, abatido no dia 22 de janeiro de 1945, quando atacava uma locomotiva estacionada em uma localidade próxima de Milão, em cumprimento de sua 16º missão ofensiva. Falou pelo rádio: Há 20 milímetros em quantidade! Depois mergulhou no flak para o ataque, e não tornou a sair: meteu a asa na chão, explodiu.

4 – 2º Tenente Aviador Frederico Gustavo dos Santos – em combate no dia 13 de abril de 1945.









Frederico Gustavo dos Santos, 1º Tenente Aviador (post-mortem), nascido no dia 09 de outubro de 1925, filho do Dr. João Gustavo dos Santos e de D. Luísa Santos.

Sentou praça no dia 23 de maio de 1944. Faleceu em combate na Itália no dia 13 de abril de 1945. Teve cinco citações e desempenhou 44 missões de guerra.

Agraciado com as seguintes medalhas: Cruz de Aviação (fita A), Cruz de sangue, Cruz de bravura, Medalha da Campanha do Atlântico Sul e AIR Medal. Sepultado em Pistóia. Suas cinzas repousam no monumento aos mortos da segunda guerra mundial.

Aspirante Aviador da Reserva Convocado Frederico Gustavo dos Santos, abatido quando cumpria a sua 44ª missão de guerra; foi atingido às 09h30m do dia 13 de abril de 1945, no momento em que atacava um depósito de munições ao Norte de Casarsa.

O deposito explodiu violentamente atingindo o avião, arrancando uma das asas e fazendo com que o mesmo se precipitasse ao solo. Era muito jovem. Não tinha completado 20 anos.

5 – 1º Tenente Aviador Luiz Lopes Dornelles – em combate no dia 26 de abril de 1945.








Luiz Lopes Dornelles, capitão Aviador (post-mortem), nascido no dia 09 de junho de 1920, filho do General Argemiro Dornelles e de D. Elília Lopes Dornelles. Sentou praça no dia 01 de abril de 1939. Faleceu em combate na Itália no dia 26 de abril de 1945.

Teve nove citações e desempenhou 89 missões de guerra. Agraciado com as seguintes medalhas: Campanha da Itália, Cruz de Aviação (fitas A e B), Cruz de Sangue, Cruz de Bravura, Medalha do Atlântico Sul, AIR Medal, e Distinguished Flyng Cross ( AIR Medal com Clusters).

Sepultado em Pistóia. Suas cinzas repousam no monumento aos mortos da segunda guerra mundial. Tenente Aviador Luiz Lopes Dornelles, abatido no dia 26 de abril de 1945, quando atacava uma locomotiva em Alexandria, enfrentando pesada artilharia.

Foi talvez a morte mais violenta e brutal registrada durante a campanha. Era 7h05m do dia 26 de abril, quando mergulhou para metralhar a locomotiva; não se sabe se desfaleceu na vertigem do pique ou se o aparelho não atendera ao seu comando. A verdade porém, é que mergulhou solo a dentro sem esboçar qualquer manobra.

No dia seguinte os patriotas italianos liberaram Alessandria, Gênova, Turim e Milão